
Líder do PSOL na Câmara aponta contrassenso dos
parlamentares que defendem a permanência de Cunha, mas querem o
impeachment da presidenta: "Cunha é quem está sob suspeita!"
Por Najla Passos, da Carta Maior
Brasília – A semana da volta do recesso parlamentar
foi marcada por sucessivas demonstrações de força do presidente da
Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) que, mesmo sob suspeita de recebimento
de propina de empresas investigadas pela Operação Lava Jato, se mantém
dando as cartas no parlamento e preparando o terreno para a construção
do impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
Apesar do pedido do PSOL para que ele fosse afastado do cargo
enquanto durarem as investigações, Cunha obteve apoio dos líderes das
bancadas para continuar à frente da Câmara. Também conseguiu manter sob
sigilo as investigações que vêm sendo realizadas pela consultoria
privada Kroll, contratada pela CPI da Petrobrás, mas cujo teor dos
trabalhos até mesmo os membros da comissão desconhecem.
“É impressionante a sustentação que ele tem no parlamento.
Praticamente todos os líderes defenderam a permanência dele no cargo. A
liderança do PSDB chegou a dizer que se Cunha fosse afastado, a
presidenta Dilma também teria que ser. Acontece que a presidenta Dilma
não está sendo investigada por suspeita de corrupção. E ele está”,
afirma o líder do PSOL na Câmara, deputado Chico Alencar (RJ).
Segundo ele, o apoio dos parlamentares à Cunha é prova de que imperam
dois pesos e duas medidas na Câmara, usados ao bel prazer dos
interesses pessoais dos deputados. “Aqui o que existe é a ética de
ocasião e a moralidade pública seletiva. Há hoje uma grande blindagem ao
Cunha, mas isso também é algo que pode mudar, dependendo da
conjuntura”, alerta.
A lógica do afastamento
Alencar garante que o pedido do PSOL jamais visou caçar o mandato de
Cunha, mas apenas afastá-lo de um dos cargos mais importantes da
República enquanto pairarem suspeitas sobre ele. “Se um ministro fosse
acusado de envolvimento na Lava Jato, o clamor para seu afastamento
seria tão grande que ele não duraria nem um dia no cargo. Mas o
presidente da Câmara, que deve ser indiciado nos próximos dias, continua
no poder”, compara.
O deputado avalia, porém, que a forma autoritária e pouco democrática
que Cunha conduz a administração da Câmara começa a sofrer desgastes.
“O absurdo do sigilo dos trabalhos da Kroll, paga com dinheiro público,
já começou a sofrer oposição dentro da própria CPI. Tanto que o
presidente da Comissão já se dispôs a fazer uma reunião, na próxima
semana, para abrir as informações pelo menos para os membros da CPI. Não
foi em vão nosso esforço”, ressaltou.
Construção do impeachment
Para o líder do PSOL, não restam dúvidas de que o propósito de Cunha é
desgastar o governo ao máximo e construir o caminho para o impeachment
da presidenta Dilma, manobra que, apesar de interessar a parte
expressiva dos partidos de oposição e da própria base do governo, ainda
não encontra sustentação jurídica.
Exemplo disso, segundo ele, foi a decisão do presidente de colocar na
ordem do dia, e em regime de urgência, a votação das contas dos
ex-presidentes Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio
Lula da Silva, abrindo, assim, espaço para a rejeição das contas da
presidenta Dilma.
“É claro que deveria ser natural o parlamento analisar contas do
executivo, imediatamente no ano subsequente à sua execução. Mas aqui
isso vai acumulando, tanto que nós avaliamos contas do Itamar Franco, de
mais de 20 anos atrás. Se essas contas fossem reprovadas o que
aconteceria? Ele ficaria impedido de se candidatar nas próximas
eleições? Mas nem vivo ele está mais”, ironiza.
Para ele, ficou evidente que tudo não passou de um jogo armado. “Foi
um exercício de celeridade endereçada. Ninguém queria saber de nenhuma
dessas contas atrasadas, mas elas foram colocadas na pauta com urgência
justamente para limpar a pauta e eles poderem analisar as contas da
Dilma de 2014. O interesse é político, mas que conta com esse arcabouço
legal de que é prerrogativa do congresso analisar conas de presidentes
da república”, esclarece.
Indiciamentos prováveis
Alencar avalia também que, apesar da força demonstrada por Cunha,
paira no ar do parlamento uma forte tensão por causa dos prováveis
indiciamentos de parlamentares que, todos acreditam, devem ocorrer ainda
este mês. “A recondução do procurador-geral da República, Rodrigo
Janot, ao cargo, foi acompanhada por deputados, inclusive o próprio
Cunha, com certo temor”, afirma.
Para o deputado, esses prováveis indiciamentos devem mudar a
correlação de forças na casa. “Há uma contenção de jatos da Lava Jato no
Congresso Nacional, como se a corrupção fosse um problema específico do
executivo. Mas a situação do parlamento também não é tranquila. Com
divulgação da lista dos parlamentares envolvidos, essa situação vai
mudar”, aposta.
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